Nos últimos anos, diversos estudiosos têm contribuído para o avanço da crítica na área da literatura infantil e juvenil, particularmente em decorrência do maior número de livros publicados a cada ano destinados às crianças e aos adolescentes. No livro Leitura e literatura infanto-juvenil: memória de Gramado (2004), Ceccantini pontua a escassa bibliografia sobre a literatura infanto-juvenil brasileira, sendo que o aumento sistemático da produção teórica e crítica ocorreu apenas nas últimas décadas. Este crescimento dos estudos, “[...] não significa, contudo, que o tema esteja nem de longe esgotado como objeto de pesquisa [...], não se pode pensar em um campo de pesquisa suficientemente investigado.” (CECCANTINI, 2004, p. 30). Considerando esses aspectos, em minha pesquisa de doutorado, foram selecionadas as obras narrativas destinadas ao público juvenil escritas pela brasileira Stella Maris Rezende (1950) para serem analisadas de maneira sistemática, investigando de modo vertical o projeto literário da escritora. A escolha dessa autora deve-se ao fato de Rezende ter sido agraciada com diversos prêmios literários em sua trajetória, que conta com aproximadamente 40 obras publicadas. A escritora foi quatro vezes vencedora do Prêmio Jabuti, um dos mais representativos prêmios literários brasileiros, destacando-se o fato de que em 2012 A mocinha do Mercado Central (São Paulo: Globo Livros, 2011) foi obra contemplada tanto com o Prêmio de Melhor Livro Juvenil quanto com o Prêmio de Melhor Livro de Ficção do Ano. Outro fator preponderante na seleção das narrativas da escritora é o fato de Stella Maris Rezende abordar, com sua escrita, questões das mais relevantes sobre o universo feminino. Como afirma Branco, a literatura feminina é incômoda, polêmica por não se calar e também audaciosa, pois se posiciona “[...] em relação à falência do modelo-de-comportamento feminino herdado da sociedade tradicional [...]” (COELHO, 1993, p. 16). A análise dos diversos títulos de Stella Maris Rezende possibilitou perceber que sua obra instaura um duplo desafio: a produção de uma literatura infantil e juvenil consistente, contribuindo para a afirmação e consolidação de um campo literário que está em constante evolução, e, ao mesmo tempo, a exploração da temática voltada à questão do específico feminino, debatendo problemas vinculados à imagem social da mulher.  O projeto estético das obras de Stella Maris Rezende possui uma preocupação especial com as personagens femininas, apresentando-as francamente como protagonistas, em sua diversidade e complexidade, e explorando elementos de composição relacionados à pauta da crítica feminista. Com jovens e mulheres independentes, Rezende questiona o machismo de maneira direta, assim como os diferentes preconceitos em relação às mulheres. Sua obra, de fato, pode ser classificada como literatura feminina, pois “[...] diz respeito à mulher e expressa a realidade de um ponto de vista da mulher e em função daquilo que ela vivencia.” (PINTO, 1990, p. 25).